APRESENTAÇÃO
MANIFESTO DA CRÔNICA ANACRÔNICA
O link abaixo nos mostra os originais de Marcel Proust. Ele escrevia a mão, repassava o texto aos chamados esteno-datilógrafos, as páginas datilografadas lhe eram devolvidas, então ele rabiscava, cortava palavras, frases, parágrafos, e depois colava novas notas manuscritas em tiras, nas bordas. Vejam, é incrível:
Esse outro link reúne páginas manuscritas ou revisadas de vários importantes escritores do passado:
O seguinte nos oferece uma bela conversa de especialistas na obra e nos originais de Proust. Ele deixava louco seus editores, pois revisava até as provas da editora, vindas da gráfica, onde cada letra era um pequeno protótipo metálico que os operários encaixavam, um a um, nos moldes das páginas para impressão.
Fico imaginando a loucura que era o datilógrafo decifrar todo esse jogo intrincado de rabiscos e colagens, Proust devia ter algum parceiro refinado na penosa empreitada, só pode ser isso. Fico imaginando também, como num sonho, eu assentado ao lado dele, seus olhos lânguidos, enormes, depositados na telinha do Macintosh a nossa frente, e eu ensinando para ele, meu bom colega, os vários recursos do mais básico dos modernos editores de texto. Aposto que ia aprender tudo na primeira aula, o que acham?
Pois é, as eras passam, os suportes para a arte mudam, a arte muda. Eu nasci em seis de janeiro de mil e novecentos e sessenta e seis, antes dos tempos da brilhantina, quando a TV tinha apenas dois canais e eram os dois em preto, branco e quinhentos tons de cinza. Fui comprar meu primeiro PC pouco antes de completar meus trinta anos. Até então, tiradas as devidas proporções, eu escrevia com o mesmo espírito e as mesmas ferramentas mecânicas de Hermann Hesse, André Gide, Pablo Neruda ou João Guimarães Rosa, meus irmãos adotivos, imbatíveis guerreiros da alma! Primeiro, tomava notas usando essa maravilha da técnica chamada caneta esferográfica, muito menos orgânica mas muito mais eficaz do que a caneta tinteiro, sua nobre ancestral. Daí, passava para a máquina. Depois que estava tudo bonitinho, fazia como meu amigo Marcel, só que sozinho, sem assistência: rabiscava por cima, recortava, colava, emendava para, em seguida, datilografar tudinho de novo! Nossa! Pensando bem, ein, eram tempos heróicos!
Um quarto de século depois de minhas primeiras experiências no computador, estou chegando, nesse blog, com a ajuda de meu jovem professor de informática, o Luiz Dionísio, a um modo muito próprio de talhar a esculto-escritura. Já faz algum tempo que trabalho mesmo entre a pesquisa antropológica, a arte plástica e visual, a foto, a videografia e a escrita, então dificilmente encontraria um suporte melhor para minha arte muito específica do que esse blog, onde posso englobar, enblogar, enfeixar as várias tiras de minha personalidade artística num só tecido comum. Sem falar que com a arma tecnológica de meu celular, carrego sem sobrepeso, por onde andar, uma máquina de fotografar e filmar que, se não é das melhores, serve o bastante. Como diria o mineiro, Deuzé bão, tudo vem na hora certa, né verdade?!
Não poderia, contudo, iniciar minha jornada desprezando o legado de meus antepassados manuscritores picterodactilógrafos, afinal, ninguém edifica, ninguém edita sobre o nada. Daí o recurso à pura literatura, ao escrever com gosto artesanal, daí o anacrônico dessas crônicas. Aqui entre nós, a tecnologia vai ser, nesse tecido, apenas um chamarisco, a essência da coisa é das antigas, já vou avisando, que ninguém se engane a esse respeito, right!?
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